A imprensa mundial está divulgando possíveis opções de medicamentos para o tratamento da COVID-19, são elas: Hidroxicloroquina e Cloroquina, registradas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para o tratamento de artrite, lúpus eritematoso, doenças fotossensíveis e malária. Esta possibilidade foi levantada com base em evidências científicas sobre estes medicamentos estarem mostrando resultados promissores em testes para o tratamento do COVID-19.
Primeiramente, utilizaremos os dados do REUQUINOL® (Sulfato de Hidroxicloroquina), da Apsen Farmacêutica S.A., que é um medicamento similar equivalente ao medicamento de referência (Cloroquina), para esclarecer e elucidar algumas informações a seu respeito.
O REUQUINOL® indicado para o tratamento de:
- Afecções reumáticas e dermatológicas (reumatismo e problemas de pele);
- Artrite reumatoide (inflamação crônica das articulações);
- Artrite reumatoide juvenil (em crianças);
- Lúpus eritematoso sistêmico (doença multissistêmica);
- Lúpus eritematoso discoide (lúpus eritematoso da pele);
- Condições dermatológicas (problemas de pele) provocadas ou agravadas pela luz solar.
- Malária (doença causada por protozoários): para tratamento das crises agudas, tratamento supressivo de malária por Plasmodium vivax, P. ovale, P. malariae e cepas (linhagens) sensíveis de P. falciparum (protozoários causadores de malária) e tratamento radical da malária provocada por cepas sensíveis de P. falciparum.
O medicamento em questão possui diversas ações farmacológicas, tais como: interferência com a atividade enzimática, ligação ao DNA, inibição da formação de prostaglandinas, ruptura das células dos protozoários e possível interferência no aumento de produção de células de defesa. E, em doenças reumáticas, sua função consiste na inibição da interação antígeno-anticorpo, inibição da síntese de interleucina-1 (IL-1) e da degradação da cartilagem induzida por esta citocina, e inibição das funções lisossomais dos fagócitos e dos macrófagos.
Conhecido quimicamente como 2-[4-[(7-cloro-4-quinoil)amino]pentil]etilamino]etanol sulfato (1:1), o fármaco é rapidamente absorvido após administração oral, com uma biodisponibilidade média de 74%. Distribui-se amplamente pelo organismo, sendo acumulado nas hemácias e em alguns órgãos como os olhos, rins, fígado e pulmões, onde pode se armazenar por tempo prolongado. A Hidroxicloroquina é convertida parcialmente em metabólitos ativos no fígado e é eliminada, sobretudo, por via renal, mas também na bile. Sua excreção é lenta, sendo a meia-vida de eliminação terminal de aproximadamente 50 dias (sangue total) ou 32 dias (plasma).
Vale ressaltar que a Hidroxicloroquina atravessa a barreira placentária e possivelmente passa ao leite materno, assim como a cloroquina.
Por se tratar de um medicamento similar, apenas dados pré-clínicos limitados estão disponíveis para Hidroxicloroquina, portanto, dados da cloroquina são considerados devido à semelhança da estrutura e propriedades farmacológicas entre os 2 produtos.
Por fim, vale mencionar que a Hidroxicloroquina é contraindicada para pacientes com maculopatias (retinopatias) pré-existentes, pacientes com hipersensibilidade conhecida aos derivados da 4-aminoquinolina, não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica, e é contraindicada para menores de 6 anos.
Estas informações do medicamento REUQUINOL® foram retiradas dos dados fornecidos em sua bula, que pode ser acessada através do bulário da ANVISA.
Uma vez que as principais informações sobre o fármaco foram elucidadas, é possível, entender o resultado dos atuais estudos científicos que foram realizados:
- Um estudo in vitro avaliou o efeito antiviral da Hidroxicloroquina contra o SARS-CoV-2 em comparação com a Cloroquina. O pesquisadores chineses responsáveis afirmam que a Hidroxicloroquina inibiu efetivamente a etapa de entrada do vírus na célula, assim como estágios celulares posteriores relacionados à infecção pelo SARS-CoV-2. Vale ressaltar que esse efeito também foi observado com a Cloroquina. Além disso, os pesquisadores também observaram que a Cloroquina e a Hidroxicloroquina bloqueiam o transporte do SARS-CoV-2 entre organelas das células (endossomos e endolisossomos) o que parece ser a etapa determinante para a liberação do genoma viral nas células no caso do SARS-CoV-2.
Maiores informações sobre este estudo podem ser acessadas clicando aqui.
Referência: Liu, J., Cao, R., Xu, M. et al. Hydroxychloroquine, a less toxic derivative of chloroquine, is effective in inhibiting SARS-CoV-2 infection in vitro. Cell Discov 6, 16 (2020).
- Pesquisadores conduziram um estudo clínico aberto não randomizado. Apesar de seu pequeno tamanho amostral (foram 20 pacientes tratados), os autores afirmam que essa pesquisa mostra que o tratamento com Hidroxicloroquina é significativamente associado à redução/ desaparecimento da carga viral em pacientes com COVID-19. Além disso, inferem também que seu efeito é reforçado pela Azitromicina.
Maiores informações sobre este estudo podem ser acessadas clicando aqui.
Referência:Gautret et al. (2020) Hydroxychloroquine and azithromycin as a treatment of COVID‐19: results of an open‐label non‐randomized clinical trial. International Journal of Antimicrobial Agents – In Press 17 March 2020 – DOI: 10.1016/j.ijantimicag.2020.105949
- De acordo com revisão sistemática, há evidência pré-clínica da eficácia e evidência de segurança do uso clínico de longa data para outras indicações, o que justifica a pesquisa clínica com a Cloroquina em pacientes com COVID-19. A conclusão dessa revisão foi que dados de segurança e dados de ensaios clínicos de maior qualidade são urgentemente necessários.
Maiores informações sobre este estudo podem ser acessadas clicando aqui.
Referência: Cortegiani A, Ingoglia G, Ippolito M, Giarratano A, Einav S. A systematic review on the efficacy and safety of chloroquine for the treatment of COVID-19. J Crit Care. 2020 Mar 10.
Tendo em vista os estudos, é importante ressaltar que até o presente momento, ainda não houve a inclusão de indicações terapêuticas novas para os medicamentos Hidroxicloroquina e Cloroquina.
Por conta das recentes notícias divulgadas, a procura pela Hidroxicloroquina no Brasil aumentou rapidamente, e alguns pacientes que dependem deste medicamento para sobreviver procuraram pela ANVISA para denunciar o desabastecimento no mercado.
Sendo assim, como medida protetiva, a ANVISA enquadrou a Hidroxicloroquina e a Cloroquina como medicamentos de controle especial, uma vez que a falta dos produtos pode deixar os pacientes com malária, lúpus e artrite reumatoide sem os tratamentos adequados. A nova categoria significa que o medicamento só poderá ser entregue mediante receita branca especial em duas vias.
Dessa maneira, médicos que fazem a prescrição de Hidroxicloroquina ou Cloroquina já devem começar a utilizar este formato, e os pacientes que já fazem uso do medicamento poderão continuar utilizando sua receita simples para comprar o produto durante o prazo de 30 dias. A receita será registrada pelo farmacêutico que já está obrigado a fazer o controle do medicamento no momento da venda.
Órgãos importantes como ANVISA e o U.S. Food and Drug Administration (FDA) já se pronunciaram a respeito das recentes notícias para o tratamento do COVID-19.
No dia 19 de março de 2020, o (FDA), publicou uma nota a fim de divulgar seus atos para facilitar o desenvolvimento de tratamentos para o COVID-19, na qual o Secretário de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, Alex Azar, inferiu que o país lidera o mundo diante das investigações da eficácia dos medicamentos, buscando fornecer aos profissionais da saúde americanos as ferramentas necessárias para salvar vidas. Além disso, Stephan Hahn, comissário da FDA enfatizou que estão procurando com urgência todos os meios de prevenção e tratamento para o COVID-19.
Apesar disso, a nota divulgada informa que por enquanto não existem terapêuticas ou medicamentos aprovados pelo FDA para tratar, curar ou prevenir o COVID-19, e adiciona que existem vários tratamentos aprovados pelo FDA que podem ajudar apenas a aliviar os sintomas.
No mesmo dia, a ANVISA se pronunciou através de uma nota técnica divulgada em seu site, afirmando que: “Apesar de promissores, não existem estudos conclusivos que comprovam o uso desses medicamentos (Hidroxicloroquina e Cloroquina) para o tratamento da Covid-19. Portanto, não há recomendação da Anvisa, no momento, para a sua utilização em pacientes infectados ou mesmo como forma de prevenção à contaminação pelo Novo Coronavírus.”
Vale ressaltar que, para a inclusão de indicações terapêuticas novas em medicamentos, é necessário conduzir estudos clínicos em uma amostra representativa de seres humanos, demonstrando a segurança e a eficácia para o uso pretendido. Portanto, após a análise de todas as informações, pode-se inferir que a automedicação dos medicamentos Hidroxicloroquina e Cloroquina pode representar um grave risco à sua saúde, podendo causar diversos problemas como a intoxicação medicamentosa.
REFERÊNCIAS:
ANVISA. Bulário Eletrônico. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/datavisa/fila_bula/index.asp. Acesso em: 20 mar. 2020.
ANVISA. Esclarecimentos sobre hidroxicloroquina e cloroquina. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/noticias?p_p_id=101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU&p_p_col_id=column-2&p_p_col_pos=1&p_p_col_count=2&_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_groupId=219201&_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_urlTitle=covid-19-esclarecimentos-sobre-hidroxicloroquina-e-cloroquina&_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_struts_action. Acesso em: 20 mar. 2020.
ANVISA. Hidroxicloroquina vira produto controlado. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/noticias/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/hidroxicloroquina-vira-produto-controlado/219201?p_p_auth=m3enjWDp&inheritRedirect=false&redirect=http%3A%2F%2Fportal.anvisa.gov.br%2Fnoticias%3Fp_p_auth%3Dm3enjWDp%26p_p_id%3D101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU%26p_p_lifecycle%3D0%26. Acesso em: 20 mar. 2020.
ANVISA. Nota Técnica sobre Cloroquina e Hidroxicloroquina. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/219201/4340788/Nota+Te%C2%B4cnica+sobre+Cloroquina+e+Hidroxicloroquina.pdf/659d0105-60cf-4cab-b80a-fa0e29e2e799. Acesso em: 20 mar. 2020.
APSEN. REUQUINOL®. Disponível em: https://www.apsen.com.br/index.php?modulo=produtos&id_bula=49. Acesso em: 21 mar. 2020.
CELL DISCOVERY. Hydroxychloroquine, a less toxic derivative of chloroquine, is effective in inhibiting SARS-CoV-2 infection in vitro. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41421-020-0156-0. Acesso em: 21 mar. 2020.
MÉDITERRANÉE INFECTION. HYDROXYCHLOROQUINE AND AZITHROMYCIN AS A TREATMENT OF COVID-19. Disponível em: https://www.mediterranee-infection.com/hydroxychloroquine-and-azithromycin-as-a-treatment-of-covid-19/. Acesso em: 21 mar. 2020.
PUBMED.GOV. A systematic review on the efficacy and safety of chloroquine for the treatment of COVID-19. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32173110. Acesso em: 21 mar. 2020.
U.S. FOOD & DRUG ADMINISTRATION. Coronavirus (COVID-19) Update: FDA Continues to Facilitate Development of Treatments. Disponível em: https://www.fda.gov/news-events/press-announcements/coronavirus-covid-19-update-fda-continues-facilitate-development-treatments. Acesso em: 20 mar. 2020.
Giulia Forni de Almeida
Assuntos Regulatórios