Drogas legais e potencialmente letais

12 anos atrás

Escrito por Alice A da Matta Chasin | 01 Junho 2010
Após a era das “super-drogas’ assistimos agora ao preocupante aumento das drogas sintéticas.

As “super-drogas” significaram o uso da tecnologia e de conhecimentos de química e cinética para a produção de formas com teores aumentados de princípio ativo, como é o caso do skunk (maconha obtida de forma a concentrar em até 5 vezes o teor de THC) ou do crack, forma básica da cocaína, que pode ser fumada pois  se volatiliza às temperaturas elevadas ao contrário da forma de sal (cloridrato de COC), que se decompõe com o aumento da temperatura. O uso da cocaína na forma de crack, ou seja, fumada, é comparado em termos de velocidade de absorção à via intravenosa (“picada”). A extensa área de superfície dos pulmões favorece a efetiva absorção desta forma da cocaína. A ação é rápida e os efeitos intensos são comparáveis aos que se seguem a uma “picada” e ocorrem em 1 a 2 minutos. A duração dos efeitos, também à semelhança da via intravenosa, é considerada curta, o que requer a utilização de novas quantidades para manter o estado de intoxicação. O ato de fumar cocaína apresenta a agravante de facilitar o reforço associado à dependência, tanto por constituir  uma via de administração socialmente aceita (não requer a parafernália associada a “drogas” ilícitas, como agulhas, seringas, etc) como por não oferecer riscos de transmissão de AIDS, hepatite, etc. Da mesma forma o ice drop é a forma básica da metanfetamina que pode ser fumada.

As assim chamadas Drogas sintéticas são substâncias ou misturas de substâncias psicoativas produzidas por síntese química, a partir de substâncias  não encontradas na natureza. Segundo relatório conjunto da EUROPOL (polícia da União Européia) e do  European Monitoring Centre for Drug Addiction (EMCDD) divulgado em 27 de abril de 2010, há 24 novas drogas psicoativas, todas proibidas, ofertadas no mercado europeu no ano de 2009 (http://maierovitch.blog.terra.com.br/2010/04/27/alerta-da-policia-eobservatorio-24-novas-drogas-no-mercado/).

Dentre essas substâncias estão a maconha sintética, o SPICE,  vendida para uso em incenso que consta de uma mistura de ervas naturais às quais são adicionados agonistas (agem nos mesmos centros produzindo o mesmo efeito) canabinóides . Dentre esses, o JHW-018, CP-47,497, HU-210,  apresentam  alta potência (4 a 5vezes maior que o THC). São vários os tipos de SPICE e seu uso gera efeitos semelhantes aos de uma intoxicação severa por maconha. Significa  alternativa legal de consumo da droga em vários países e o fato de que podem ser comercializados pela internet e de que não são detectados por técnicas disponíveis na rotina dos Laboratórios de Toxicologia implica em severos problemas de Saúde Pública.

Outra droga sintética que não está sob controle internacional e, portanto, – seus padrões de uso, provavelmente, estejam sendo subestimados, é a MEFEDRONA, uma droga sintética muitas vezes utilizada como uma alternativa legal para as anfetaminas ou a cocaína e que se espalha em diferentes partes do mundo, principalmente Europa,  América do Norte e Austrália (http://www.unodc.org/southerncone/pt/frontpage/2010/04/07-mefedrona-uma-droga-legal-e-potencialmente-letal.html).

A MEFEDRONA é a 4-metil metacatinona (4-MMC), composto utilizado para síntese orgânica e apresenta e efeitos semelhantes à cocaína e ao MDMA (estimulante, entactógeno e alucinógeno); origina o metabólito 4-metilefedrina, vasoconstrictor periférico e seu uso pode desencadear depressão e ataques de pânico. Ainda há poucos estudos sobre sua cinética e mecanismos de ação.

Os derivados da piperazina, principalmente o mCPP (meta-clorofenilpiperazina), vendido como ECSTASY, são estimulantes do sistema nervoso central que vêm ganhando popularidade na Europa, por serem considerados alternativa legais aos derivados anfetamínicos. Os efeito euforizantes acontecem nas doses de 75 a 150 mg  e duram de 6 a 8 horas.

O ECSTASY, por sua vezjá utilizado há algum tempo, segundo o Relatório, sofreu um boom. Outros derivados da fenetilamina, como o DOB (2,5-dimetoxi-4-bromoanfetamina), alucinógeno com alta toxicidade, são agora apontados como aqueles com crescimento de uso.

A forma de comprimidos coloridos com desenhos ilustrativos é uma das principais com que se comercializa o ECSTASY, fazendo com que os usuários e outros profissionais da saúde ou não relacionem essa forma farmacêutica com o MDMA, que é o princípio ativo do ECSTASY. Porém, nos últimos anos isso não deve ser mais considerado como característica dessa designer drug, uma vez que já foram encontrados vários princípios ativos e associações diferentes em comprimidos apreendidos, como por exemplo: MDMA e Tramadol; mCPP e 1% de cocaína; TFMPP; mCPCPP; MDMA e mCPP; metoclopramida; MDMA, Cetamina e Cafeína; Paracetamol, Oxicodona e Cafeína; MDMA e 4MMC entre outros.

Algumas dessas associações podem apresentar potencialização dos efeitos prazerosos e desencadear efeitos tóxicos mais potentes, como por exemplo, a interação entre mCPP e 1% de cocaína ou diltiazem, em que a mesma diminui a atividade da CYP2D6 (P-450), que é responsável pela metabolização do mCPP. Também a interação entre MDMA e mCPP provoca a exacerbação dos efeitos relacionados com a estimulação serotoninérgica (síndrome serotoninérgica) por atuarem com mecanismos de ação semelhantes.

Outra associação muito utilizada pelos jovens é entre o ECSTASY e o VIAGRA® (citrato de sildenafil), chamada popularmente de “SEXTASY”. O ECSTASY aumenta a empatia, a motivação e a desinibição em termos sexuais, porém em alguns homens pode provocar a impotência sexual devido à constrição de vasos periféricos, fato pelo qual se associa o VIAGRA®. Essa associação torna-se um problema também, uma vez que o indivíduo pode estar sob a influência de várias substâncias psicoativas e não adotar comportamentos adequados para se evitar doenças sexualmente transmissíveis. Estudos sobre a possível interação entre o sildenafil e o MDMA ainda se encontram em fase de experimentação, porém o que possivelmente pode ocorrer é uma potencialização dos efeitos adversos do sildenafil, como angina ou insuficiência cardíaca (uma vez que o MDMA também é responsável por eventos graves em nível cardiovascular). Pode também ocorrer mialgia, que se agravaria pela rabdomiólise, nefrotoxicidade, neurotoxicidade e hepatotoxicidade. 

O GHB (gama hidroxi-butirato) é um ácido graxo de cadeia curta, presente naturalmente no SNC de mamíferos, apresenta estrutura química semelhante ao ácido gama-aminobutírico (GABA), com efeito neurotransmissor ou neuromodulador inibitório. Em 1960, foi usado como um anestésico e hipnótico (com efeitos semelhantes aos barbitúricos e benzodiazepínicos) em seres humanos na Europa, mas seu uso foi suspenso devido aos diversos efeitos colaterais. O GHB, nas ruas, também é chamado de Liquid Ecstasy, Grievous Godily Harm, G ou Gina, Liquid E, Liquid X, Gib, Cherry Meth, Água de Fogo, Zen ou Liquid Death, Sopa, Água Salgada, GAMA-OH, Scoop. Seu principal uso ocorre por usuários jovens em festas rave, fisiculturistas (estimula a produção do hormônio do crescimento) e também por assaltantes ou estupradores.

Os análogos do GHB, que incluem GBL (gama butirolactona), BD (1,4 Butanediol), são drogas que possuem estruturas químicas semelhantes ao GHB. Estes análogos produzem efeitos similares àqueles associados com o GHB e são usados como substitutos. Os efeitos do GHB e análogos são semelhantes, sendo ainda mais intensos quando associados ao álcool. Seus efeitos estão diretamente relacionados com a dosagem utilizada, como por exemplo, 10 mg/kg: euforia, amnésia, redução da ansiedade, relaxamento, aumento da libido e efeito anabólico; 20 e 30 mg/kg: sonolência; acima de 50 mg/kg: anestesia, inconsciência, coma, tremores, contrações musculares clônicas, depressão do SNC e respiratória.

A CETAMINA ou KETAMINA é um anestésico dissociativo que atua como antagonista não competitivo do receptor NMDA, ativado pelo glutamato. Utilizado na medicina humana de modo seguro principalmente por não deprimir de forma acentuada a respiração e também aplicável na medicina veterinária.

 É também usada para fins recreativos como droga de abuso em abordagem sexual, sob a forma de pó branco, aspirado por via nasal, ou em comprimidos semelhantes ao ECSTASY, que podem ser utilizados por via oral. . Outra forma encontrada é em solução incolor, que é injetada por via intramuscular. Nas ruas, é conhecido como: K, Special K, Vitamina K, Pó dos Anjos, entre outros. Os principais efeitos são: melhora no humor, prejuízo no contato com a realidade, despersonalização, alucinações visuais, prejuízo na atenção/memória. Doses mais elevadas podem provocar: redução da função motora, taquicardia ou bradicardia.

 O OEDT (Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência), com sede em Lisboa, salienta no relatório que os novos compostos sintéticos, comercializados pela Internet como «legais» ou com a advertência «não destinados a consumo humano», são um «desafio crescente», uma vez que não estão regulamentados http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=170349).

O UNODC (órgão das Nações Unidas que trata das questões da drogas) mantém o Programa de Monitoramento, Análise, Relatórios e Tendências sobre Drogas Sintéticas ( SMART, na sigla em inglês). O trabalho se dá  conjuntamente com governos para desenvolver, avaliar e reportar dados e informações sobre drogas sintéticas, auxiliando os países no planejamento da prevenção e na elaboração de legislações que respondam ao tema.

Alice A da Mata Chasin, Rafael Lanaro

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